Gostei do título deste artigo. No último final de semana ministrei mais uma turma do meu curso de Memorização, Leitura Dinâmica e Estratégias de Aprendizagem, e acabei percebendo que existem muitos fatos sobre memória que acabam passando despercebidos na nossa rotina diária.
Por exemplo, podemos facilmente utilizar técnicas mnemônicas para memorizar uma centena de objetos na sequência, mas hoje de manhã eu saí de casa e só depois de estar no carro percebi que tinha esquecido minha máscara (quando este artigo está sendo escrito, estamos com obrigação de utilizar máscaras em decorrência do COVID-19, espero que não dure muito tempo).
Depois de terminar de rir de mim mesmo e passar pelo “Fofo” (é o apelido que eu dou para o meu cachorro, que fica pulando em mim quando entro ou saio de casa, o nome é homenagem ao cachorro que os personagens do Harry Potter precisam passar para pegarem a Pedra Filosofal, pelo desafio que é entrar e sair de casa com ele lá) eu comecei a me refletir sobre os tipos de memórias que utilizamos, e de como nosso estado de atenção interfere nas coisas que nos lembramos ou não.
O que vou fazer agora será reunir várias informações e conceitos que considero importantes mas que não estão incluídos na maioria dos materiais sobre memorização que encontramos.
Estado de Presença e Estado de Memória
É natural perceber que quando estamos “no automático” fazendo alguma coisa, tendemos a repetir os mesmos padrões que estamos acostumados, quando queremos nos lembrar, por exemplo, de alguma coisa que está “fora do protocolo”, será improvável que nos lembremos depois de entrar nesse padrão automático.
Só iremos nos dar conta de que esse objeto foi esquecido ou essa ação intermediária não foi feita quando sentimos sua falta.
Vou dar um exemplo fictício.
Todos os dias uma pessoa chega em casa e guarda a chave no suporte para chaves, o casaco num cabide, coloca o celular para carregar na mesma tomada de sempre, e os objetos pessoais sobre a estante.
Todos os dias a pessoa faz esse caminho retirando estes objetos antes de sair de casa para ir trabalhar.
Vamos supor que num determinado dia da semana a pessoa vai precisar passar no cartório levar um documento no seu horário de almoço, e decide que ela vai deixar o documento no carro, ela precisa se lembrar de sair com esse documento da sua casa.
O que a maioria das pessoas fazem é acordar “na rotina” e fazer todas suas tarefas matinais antes de sair de casa, e só perceber que se esqueceu de deixar esse documento no carro quando pensar sobre ele (provavelmente durante o trajeto para o trabalho ou em algum momento posterior).
Quando uma pessoa está agindo no piloto automático, é como se ela fosse um autômato programado para executar certas tarefas, sem pensar racionalmente e criticamente sobre cada uma delas.
Ou seja, se durante esse momento a pessoa come alguma coisa, ela mal vai saborear o alimento (isso também acontece com as pessoas que comem enquanto mexem no celular).
Uma forma de você evitar isso, é estar realmente consciente sobre os fatores e estímulos do mundo à sua volta, pensando no que está acontecendo aqui e agora (e não sobre outras coisas, como ocorre quase todo dia).
Estar no automático também pode te fazer dirigir para lugares errados, como dirigir em direção ao trabalho num dia em que não iria trabalhar.
Objeto inesquecível ou quebra de rotina
Uma forma de se lembrar de trazer o documento consigo, é nomeando um “objeto inesquecível”, algo que você sabe que vai se lembrar de pegar antes de ir para o trabalho, pois já está dentro da sua rotina.
O que você deve fazer é deixar esse documento num local que vai atrapalhar o ato de pegar esse objeto, te fazendo se lembrar de que deve pegar o documento também.
Obs.: Tome cuidado para não deixar o documento embaixo do seu objeto inesquecível, pois ainda assim corre o risco de pegar o objeto e não perceber que havia um papel embaixo, isso pode abalar sua auto estima rsrs.
Outra coisa a se fazer é: Ao pensar que você vai querer se lembrar de pegar um objeto diferente no outro dia, já no dia anterior você retira algum objeto do lugar, de forma que é impossível sair sem ele (o mais óbvio é a chave do carro ou o celular, que poucas pessoas esquecem).
Quando for levantar de manhã, será impossível não perceber que aquele objeto não está no lugar “de sempre” e vai se lembrar o motivo.
Pensamento Sistemático e Memória
As pessoas consideradas mais “sistemáticas” têm mais facilidade para se lembrar da onde estão as coisas, enquanto as que não são, acabam perdendo as coisas por não saberem onde deixaram.
Procure desenvolver um senso sistemático sem virar um “chato perfeccionista”.
O que fazer?
Crie o hábito de deixar as coisas sempre em lugares parecidos, dessa forma você vai saber onde é provável que tenha guardado alguma coisa, mesmo que você não se lembre da onde deixou aquilo.
Eu faço isso com muita frequência e algumas vezes fico positivamente impressionado com o fato de encontrar alguma coisa que guardei há vários anos.
No filme “Memento”, você pode acompanhar a história de um homem que sofre de perda de memória recente, a cada período de poucos minutos ele se esquece de tudo que aconteceu nos últimos meses, mas por ser sistemático, ele consegue ter facilidade para se virar no mundo e se relacionar com as pessoas, ou seja, não é necessário ter memória de tudo, mas saber como você funciona, pois isso vai te ajudar a saber como você vai pensar no futuro.
Pensamento Futuro
Uma forma de desenvolver isso é se adaptando a se perguntar “se eu estivesse precisando disso agora, onde iria procurar?”, quando você tiver uma resposta, você sabe onde deve guardar aquele objeto.
A maioria das pessoas cometem o erro de se perguntar “onde eu vou guardar isso?”, mas a resposta nem sempre mostra um lugar que você vai achar.
Criando categorias
Uma forma mais óbvia e muito válida de melhorar nossa memória cotidiana é saber em que “classe” de categoria um objeto está e qual é o lugar adequado para armazenar coisas daquela categoria.
Isso é muito particular, não existe uma forma correta.
Algumas pessoas podem ter um local para guardar “ferramentas”, automaticamente ela sabe que não vai encontrar um pendrive ali.
Outras pessoas podem ter um local para guardar “coisas pequenas”, ela sabe que pode encontrar seu pendrive lá, algumas ferramentas pequenas, e algumas outras coisas”.
Qual dessas duas opções faz mais sentido para você? Apesar de parecer óbvio para você (principalmente se você for organizado, você ficaria surpreso ao ver o tipo de “organização” que outras pessoas usam).
Tenha também um lugar para armazenar coisas muito genéricas, pois a quantidade de categorias possível seria quase infinitamente superior à quantidade de objetos possíveis (já que um objeto pode ser separado por cor, tamanho, utilidade, entre outras categorias).
Se você tiver uma caixa para guardar todas as coisas “aleatórias” ela pode ficar um pouco bagunçada, mas vai te ajudar a saber onde você deixa coisas inespecíficas (a maioria das pessoas faz isso na última gaveta da copa da cozinha, na primeira ficam os talheres, na segunda os guardanapos, etc…. Na última as coisas que não são nenhuma dessas coisas mas não podem ficar “soltas” por aí).
Se você perceber que nessa caixa existem muitas coisas de uma mesma categoria, vale a pena considerar ter um local específico para esse tipo de coisa.
Neste artigo eu compartilhei diversas pequenas estratégias que sigo rotineiramente e que, até onde percebo, mais me ajudam do que me atrapalham, se você gostar, pode utilizá-las também nos processos de memória e organização.
Me conte quais são pequenas estratégias que você utiliza para se organizar e procurar se lembrar das coisas.
Bruno Gianolla